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Encontro com o Dr. Pedrosa Veríssimo

Nascimento: 4 de setembro de 1915, freguesia do Paião



Sinal: Por favor, fale-nos um pouco de si.
Pedrosa Veríssimo: É uma honra estar na escola do Dr. Joaquim de Carvalho. É como uma casa para mim. Porquê? Eu fui aluno do Professor Joaquim de Carvalho na Faculdade de Letras de Coimbra e ele foi meu professor de História da Filosofia Antiga. Mais tarde, tive-o como Professor no Curso de Ciências Pedagógicas. Ele não fazia pergunta nenhuma aos alunos, limitava-se a dar a sua lição e, terminado o tempo que ele tinha determinado para a aula, dizia sempre "Meus senhores, a hora deu, amanhã continuamos!" (risos dos alunos). Foi um professor muito ilustre.



Sinal:  Durante quantos anos lecionou?
P.V.: Ora bem, a minha vida foi repartida entre Portugal e a França. Eu estava aqui há 10 anos a ensinar o Português e o Latim, quando fui convidado para ir ensinar a História da Civilização Portuguesa para a Universidade de Toulouse. O tempo que estive aqui foi relativamente pequeno, mas depois regressei a Portugal e vim terminar ainda uma meia dúzia de anos na Escola Dr. Joaquim de Carvalho. Durante o tempo em que eu estive em França, fui-me tornando professor efetivo em várias escolas. Quando fui para França, ainda era só professor auxiliar. Antigamente, havia categorias: professor agregado, que era um professor que já tinha a sua licenciatura e que era agregado, isto é, no caso de haver necessidade, ele era chamado para trabalhar. Eu tive a sorte de encontrar logo, no ano em que terminei a licenciatura, um lugar na Figueira da Foz, porque a professora que cá estava a ensinar não era efetiva, efetivou noutro liceu, e eu tive a sorte de ir ocupar o lugar dela. De agregado passei a professor auxiliar e depois a professor efetivo. E fui então chamado a ir para França, onde tive o prazer de ensinar durante 18 anos, quer dizer, ensinei tantos anos em Portugal como em França, ou seja, 36 anos, que era o tempo necessário para obter a reforma por completo. Era quanto se exigia nesse tempo.

Sinal:  Tem um escritor preferido?
Ora bem, o escritor preferido foi , indiscutivelmente, Eça de Queirós, que considero o grande mestre da língua portuguesa, mas há outros escritores que admiro. Privei-me dos meus livros, logo que me reformei, ofereci-os à Biblioteca Municipal, de maneira que o que tenho é aquilo que a memória pôde reter e conservei ainda de memória algumas poesias, algumas de autores mais antigos, outras até de um autor que era meu contemporâneo, o Doutor José Vitorino de Pina Martins, que foi meu amigo e usava o pseudónimo poético de Duarte de Montalegre. Lembro-me desta pequena poesia dele:

Quisera, meu amor, ser triste, triste
Como a tristeza múrmura da tarde
Quisera no sorriso que sorriste
receber a chama que brilha mas não arde.

E depois ficaria dado a tudo
e depois ficaria o que ficasse
o sol é vida, o firmamento é mudo
o sol beija as estrelas
Beija, e dá-se...

(palmas)


Sinal:  101 anos é uma vida cheia. Escolha as 3 palavras que melhor descrevem a sua vida.
P.V.: Amor, trabalho (hesitação...) e dedicação.

Sinal:  Qual a pessoa que mais o influenciou? Porquê?
P.V.: Ora bem, a pergunta presta-se a várias respostas. Posso dizer que a pessoa que mais me influenciou na minha vida foi a minha própria mulher. Deixei-me apaixonar por ela, ela apaixonou-se por mim. Acompanhou-me nos momentos bons da minha vida, que foram muitos, mesmo assim.

Sinal: Se tivesse de indicar um momento mais feliz da sua vida, qual seria?
P.V.: O momento mais feliz? É uma pergunta, cuja resposta é muito difícil, porque na vida há muitos momentos que se podem considerar felizes: um encontro com um amigo, uma ida a uma conferência, ... Nós temos um poder de adaptação tão grande, que acabamos por nos agradar de tudo.

Sinal: Como era ser adolescente no seu tempo? Como ocupava os seus tempos livres?
P.V.: Dependia muito das camadas sociais, eu nasci num meio onde não havia ninguém com estudos superiores e havia muita gente analfabeta. Não se esqueçam que tenho mais de 100 anos! De há 100 anos para cá tudo tem evolucionado muito. Hoje, é já um lugar onde há gente com licenciaturas, um lugar civilizado. Eu distingui-me pelo desejo de estudar, fiz a quarta classe na escola do Alqueidão, com o professor Casimiro de Oliveira e fui para o seminário de Coimbra. Tínhamos as brincadeiras juvenis, os jogos eram o mais simples que havia, o dinheiro nesse tempo era muito pouco e éramos nós quem fabricava os instrumentos de brinquedo para nos entretermos. O jogo da palmatória, o jogo da bilharda,  os jogos de que hoje ninguém fala, jogos que serviam de distração, serviam de convívio e de ocupação do tempo.

Sinal:  Quando e por que razão decidiu ser professor?
P.V.: A resposta é um bocadito diferente daquilo que seria de esperar. Eu decidi ser professor sobretudo de Latim. Estive seis anos no seminário em Coimbra, dominava perfeitamente o Latim e adquiri o gosto de ensinar a língua latina. E, claro, concomitantemente, havia o Português. A minha decisão foi de ensinar o Latim, o Latim é que é a língua-mãe da língua portuguesa. Não queria ser professor de Português, mas sim de Latim.

Sinal: O que mais lhe agradou na profissão que exerceu ao longo de tantos anos?
P.V.: Na minha vida profissional, o que mais me agradou foi o ter bons resultados nos exames dos alunos. Eu penso que nunca tive um aluno, apresentado por mim,  que tivesse ficado  reprovado. O meu maior prazer era eu próprio corrigir as provas escritas e distinguir os bons alunos. E tive alunos muitíssimo bons.

Sinal: Quer contar-nos uma situação curiosa ou divertida ocorrida durante uma aula.
P.V.: Não houve nenhuma em especial, as minhas aulas eram todas sérias, não havia brincadeira. Dava sempre um carácter de seriedade e usava o método expositivo.

Sinal: Também foi autarca? Em que época? Que funções exerceu?
P.V.: Fui essencialmente professor, profissão que adotei com muito amor. Fui vereador da Câmara durante um mandato e depois tive, não digo a sorte e não diria também a infelicidade, deu-se a circunstância de ter de aceitar o lugar de Presidente da Câmara. Estava a exercer o meu cargo, que não exerci até ao fim do mandato, porque um dia recebi na Câmara da Figueira um grupo de pessoas da freguesia do Paião, as pessoas mais representativas da freguesia, que foram ter comigo para eu os ajudar. Quando foi criada a freguesia do Alqueidão, foi primeiramente criada somente a freguesia civil. E o Senhor Bispo de Coimbra só autorizou que fosse criada a freguesia religiosa quando o Alqueidão tivesse uma igreja. Exigiu que fosse feita uma igreja. A igreja foi feita e depois quando foi a criação da freguesia religiosa os habitantes do Alqueidão reivindicavam uma pequena parte que tinha continuado a pertencer à freguesia do Paião e que eles entendiam que devia pertencer ao Alqueidão. Eu tinha prometido o apoio aos paionensenses, mas verifiquei que os do Alqueidão tinham muita razão para quererem aquilo. Era ali  a estrada principal e havia uma capelinha no Casal Verde, um pequeno núcleo de casas que continuara a pertencer ao Paião. Ora eu tinha prometido apoio aos paionenses e, para que não se desse essa circunstância, resolvi pedir a suspensão.

Sinal: Sabemos que teve influência na implantação do edifício da nossa escola nesta localização.
P.V.: Que alternativas havia e o que o levou a defender a opção que vingou?
Eu não tinha escolhido este lugar, a pensar no sacrifício dos alunos. Muitos alunos vinham à escola de comboio, outros vinham de camioneta e eu entendia que os alunos deviam ser beneficiados com uma distância menor. E realmente o lugar que eu achava razoável para instalar o Liceu era o lugar onde está a Biblioteca Municipal. Mas eu aí não tinha o terreno disponível para ser uma escola com tudo o que era necessário, não havia espaço para isso. Eu tive de aceitar.

Sinal: Gosta de viajar? quais os lugares que mais gostou de conhecer?
P.V.: Eu não tinha meios económicos que me permitissem grandes ambições em viajar. Mesmo assim, ainda fiz algumas viagens. Eu e a minha mulher viajámos, participei em excursões organizadas, porque isoladamente não podemos obter os conhecimentos como quando vamos e alguém nos ajuda.

Sinal: Deixe uma mensagem aos leitores do Sinal.
P.V.: A mensagem que vos posso deixar é a de que procurem sempre ser ativos, diligentes, com amor ao trabalho, com amor à profissão que porventura venham a ter e que procurem triunfar na vida. Esse é o desejo que eu faço e que desejo que se realize.


Os meus votos para que esta escola continue a brilhar, a ter muitos bons alunos.

Bernardo Francisco, 8ºA
Carlota Conceição, 9ºC
Ema Caldeira,7ºA
Filipa Miranda, 7ºA
Lola Venâncio, 7ºA
Mafalda Mateus, 8ºB
Tiago Gomes, 9ºC

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